O agente etiológico é uma espiroqueta aeróbica obrigatória
que causa infecção renal crônica de animais portadores e pode ser transmitida
ao homem através do contato com urina ou tecidos desses animais. As leptospiras
penetram por cortes e abrasões, membranas mucosas, conjuntivas, inalação de
aerossol e sofrem disseminação hematógena, penetrando tecidos. Podem causar
lesão vascular e, conseqüentemente, hemorragia pulmonar, isquemia do córtex
renal, necrose de células epiteliais tubulares, destruição da arquitetura
hepática.
A doença pode se
manifestar como duas síndromes: uma doença sistêmica autolimitada (90%); ou
doença potencialmente fatal, acompanhada de qualquer combinação de
insuficiência renal, hepática, pneumonite com diátese hemorrágica. O período de
incubação varia de 5 a 14 dias, aos quais tipicamente se segue uma fase
septicêmica aguda (5-7 d), caracterizada por sintomas como febre remitente
elevada (38-40° C), faringite, erupções cutâneas maculopapulares pré-tibiais. Sufusão
(vermelhidão sem exsudato) conjuntival sem secreção purulenta e mialgia com
maior intensidade em panturrilhas e área lombar são os achados mais
característicos. Pode haver proteinúria e piúria leves, com ou sem hematúria, e
presença de cilindros hialinos ou granulosos.
Posteriormente ocorre a fase imune (4-30 d), na
qual podem existir sintomas da fase inicial, associados a icterícia,
insuficiência renal, arritmias cardíacas, sintomas pulmonares, meningite
asséptica, sufusão conjuntival com ou sem hemorragia, fotofobia, dor ocular,
adenopatia, hepatoesplenomegalia, dor abdominal. A meningite asséptica pode
causar cefaléia intensa, pulsátil, bitemporal e frontal. Os achados típicos do
LCR são pleocitose linfocítica, celularidade < 500/mm3, níveis
protéicos entre 50 e 100 mg/mL e concentração de glicose normal.
Quando grave, a leptospirose pode se manifestar
como doença de Weil – geralmente após breve melhora dos sintomas – na qual pode
ocorrer febre > 40° C, insuficiência hepática e renal agudas, pneumonite
hemorrágica e arritmia cardíaca.
A confirmação
laboratorial pode ser feita pelo teste de microaglutinação, no qual deve
ocorrer aumento no título de anticorpos de quatro vezes entre espécimes de fase
aguda e convalescença. Soroconversões tardias não são incomuns. A coleta de
sangue, LCR ou dialisado peritoneal para cultura deve ser feita durante os
primeiros 10 dias e em período febril (até duas gotas de sangue devem ser
inoculadas diretamente em meio de cultura) e a de urina, após a primeira semana.
PCR pode ser útil em casos fulminantes. Exames do soro podem indicar elevação
de bilirrubina conjugada (até 80 mg/dL), transaminases (< 200 U/L), uréia (<
100 mg/dL) e creatinina (< 2-8 mg/dL na fase aguda). Pode existir trombocitopenia.
O tratamento da
doença grave geralmente é feito com penicilina G IV (1,5 MU q6h) e o de casos
leves com doxiciclina oral (100 mg bid). É importante monitorar os que são
tratados com penicilina, pois foram descritas reações de Jarisch-Herxheimer nesses
pacientes. Na insuficiência renal oligúrica, o início rápido de hemodiálise
reduz mortalidade; a disfunção renal geralmente é revertida por completo.
Rafael Araujo Iizuka
Acadêmico de Medicina